Black Mirror, série de ficção científica criada por Charlie Brooker, tem conquistado uma legião de fãs ao redor do mundo por sua habilidade em retratar de forma assustadoramente precisa situações extremas envolvendo a interação das pessoas com a tecnologia. Cada episódio serve como um espelho distorcido da sociedade contemporânea, explorando temas como o uso de dados pessoais, privacidade e o impacto da tecnologia em nossas vidas.
A série, que acabou de disponibilizar a 6ª temporada na Netflix, nos apresenta um futuro não muito distante, onde a tecnologia avançada está intrinsecamente integrada ao nosso cotidiano. Em cada episódio, somos confrontados com um mundo onde os avanços tecnológicos, que inicialmente prometiam melhorar nossa qualidade de vida, acabam se voltando contra nós de maneiras perturbadoras.
Um dos aspectos mais aterrorizantes abordados em Black Mirror é a forma como nossos dados pessoais são explorados e manipulados. Episódios como “The Entire History of You” e “Nosedive” nos fazem refletir sobre como cada vez mais abrimos mão de nossa privacidade em troca de conveniência e aceitação social. Esses episódios ecoam as preocupações reais que temos hoje em dia, com empresas e governos coletando e utilizando nossas informações para diversos fins, muitas vezes sem nosso consentimento consciente.
Por outro lado, no episódio de abertura da nova temporada, “Joan is Awful”, traduzido para o português “Joan é Péssima”, aborda justamente uma prática preocupante: o consentimento “automático”. Ao aceitar termos de uso sem lê-los, entregamos um poder considerável às empresas, permitindo que elas ajam como desejam com base nas condições propostas, podendo nos prejudicar a longo prazo.
Na busca por agilidade, estamos acostumados a realizar tarefas com rapidez e eficiência. Infelizmente, isso também se estende à nossa abordagem em relação às políticas de uso e termos de serviço. Frequentemente, ao nos depararmos com esses documentos longos e complexos, optamos por simplesmente clicar em “Aceitar” sem realmente entender o que estamos consentindo. Esse comportamento sem questionamento nos coloca em uma posição de desvantagem, uma vez que nos tornamos vulneráveis às ações das empresas que detêm nossos dados e informações. No episódio da nova temporada, a personagem Joan se depara com uma série de televisão na qual ela mesmo protagonizava, através da inteligência artificial, capítulos reais de sua vida privada. Ao entrar em contato com o jurídico da plataforma de streaming que produziu os episódios baseados em deep fake, ela descobre que consentiu (ainda que sem saber) para tudo aquilo acontecer.
Ao concedermos nosso consentimento “automático”, abrimos a porta para uma série de abusos por parte das empresas. Muitas vezes, esses termos contêm cláusulas que permitem a coleta excessiva de dados, o compartilhamento com terceiros e até mesmo o rastreamento de nossas atividades online e offline. Ao aceitar tais condições sem analisar, estamos basicamente dando carta branca para as empresas utilizarem de maneira indiscriminada nossas informações, sem qualquer restrição significativa.
Uma das principais consequências deste tipo de consentimento não lido é a erosão da privacidade. Dados pessoais se tornaram uma mercadoria valiosa nas mãos das empresas, que os utilizam para fins comerciais, direcionamento de anúncios e até mesmo para análise comportamental. Ao negligenciarmos a leitura dos termos e políticas de uso, perdemos a oportunidade de entender como nossos dados estão sendo tratados e quem realmente os controla.
A falta de transparência e entendimento desses documentos cria uma clara assimetria de poder entre as empresas e os usuários. Enquanto umas possuem equipes legais e especialistas para redigir termos complexos, outros ficam à mercê de linguagem jurídica confusa e de difícil compreensão. Essa disparidade de conhecimento coloca os usuários em uma posição de hipossuficiência, incapazes de tomar decisões informadas sobre como suas informações pessoais são tratadas.
Para combater esse problema, legislações como a recente Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais impõem requisitos rigorosos para as empresas quanto à manipulação dos dados dos usuários. Uma das principais diretrizes estabelecidas é a obrigação de que as organizações expliquem de forma clara e objetiva em seus termos e políticas como os dados são tratados. Essa exigência visa garantir a transparência e a compreensão por parte dos usuários sobre como suas informações pessoais são coletadas, armazenadas, compartilhadas e utilizadas. Em conclusão, é indiscutível que leis de privacidade existem e são fundamentais para proteger os dados pessoais dos usuários. No entanto, é igualmente importante reconhecer a responsabilidade individual dos usuários em compreender e acatar os termos de uso e políticas estabelecidas pelas plataformas e serviços que utilizam. A simples existência de leis de privacidade não é suficiente se os usuários negligenciarem sua parte em informar-se e tomar medidas para proteger sua própria privacidade. A conscientização e ação dos indivíduos são cruciais para garantir a eficácia e o cumprimento dessas leis, assegurando assim a proteção dos dados pessoais em um mundo cada vez mais digital.
Gostou do conteúdo? Compartilhe o link nas redes sociais. Convide pessoas para lerem e se informarem também. Se quiser mais informações sobre Adequação à LGPD entre em contato.

